terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Entre Los Santos

As arquibancadas do estádio Fray Honorato Pistoia. Foto: Alessandro Bracht

Apesar de toda a entrega a descoberta de clubes do underground futebolístico mundo afora, rumei para Salta apenas com algum conhecimento do Centro Juventud Antoniana, a.k.a El Santo. Sabedor de que não jogaria como local nos meus dias salteños, notícia frustrante, a missão era conseguir a bonita camiseta da equipe. Inicialmente, pareceu impossível, apesar da quantidade significativa de antonianos exibindo-a pelas ruas. E foi graças a dois deles que percorri todas as casas de material esportivo do centro de Salta. Ocorreu assim: sem outra alternativa, interpelei dois adolescentes locais que vestiam o uniforme do CJA e lá fomos nós em uma busca que se revelou inglória. A explicação para a falta do produto foi a de que o comércio estava a espera da nova camiseta, que só chegaria em 10 de fevereiro. Estranho, pois o torneio já estava indo para sua terceira rodada. A da temporada anterior, esgotada. Acostumado a produção massiva de camisetas no Brasil e de, terminadas suas validades, encontrá-las no balaio, também achei curioso. Ao final de um par de horas, eles recomendaram que eu fosse ao estádio. Lá, eu encontraria o que buscava. Agradeci e os liberei da missão, pois creio que a dupla, apesar de toda camaradagem e boa vontade, tinha outras adolescências para cometer naquela tarde. Mas, enquanto durou, a conversa foi divertida. O futebol e meu retardamento opcional romperam o choque de gerações - aliás, estou ficando bom nisso. Os chicos antonianos estavam parcialmente certos, pois na cancha do Juventud Antoniana não encontrei apenas a camiseta, mas um ambiente interessado e satisfeito com minha presença. Recebido pelo secretário do clube, que estava em companhia de um senhor sexagenário - o fiel e eterno roupeiro de todas as categorias - não foi preciso pagar pelo que desejava: questionado por Holgar Volver (o secretário) de onde vinha, afirmei que era de Porto Alegre e hincha tricolor. Algo surpreso, perguntou se eu não tinha uma camiseta do imortal. Ela estava na mochila, esperando por aquele momento. 130 pesos economizados e, muito mais que isso, o modelo retrô 1981 deixado para adornar a sede do Centro Juventud Antoniana, ao lado de outras que saíram das mochilas de outros viajantes que amam aquilo que é impossível não amar. Acabei tomando meu caminho e logo vi o quão pelotudo havia sido: apesar da cordialidade, com direito a convite para assistir ao jogo seguinte nas tribunas (que me incomoda não ter aceito por ter de seguir viagem no dia anterior à partida), não fiz foto alguma. Ciente do pecado, voltei dias depois e pude pisar no gramado do estádio Fray Honorato Pistoia, vazio de público, mas cheio de alma futbolera. O único movimento em campo estava na conta de alguns jovens da categoria de base que treinavam sob o sol de satã, comandados por um técnico que não parecia ter mais de 20 anos. Foi a primeira vez na minha vida que entrei em campo por onde entram os jogadores. O que para muitos seria migalha, para mim foi um glória futebolística, um delírio de infância resolvido sem terapia. Após meu retorno à capital sul-riograndense, boas notícias chegam sobre Los Santos: depois de cinco rodadas, o CJA está em segundo lugar, com dez pontos, na perseguição ao tradicional Talleres de Córdoba, clube que não faz muito tempo atuava na primeira divisão do futebol argentino. A promoção é sempre uma missão difícil, especialmente quando não direta, pois exige confrontos em sistemas de playoff contra um dos clubes da divisão acima que está na condição de rebaixado indireto. O sucesso dos que vem de baixo é raro. A missão dos antonianos é romper com essa lógica em 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário