quarta-feira, 27 de maio de 2009

Gaz Metan Medias x Gloria Bistrita

Da esquerda para a direita: Torcida organizada da encosta evita a avalanche; o brasileiro Edson Grillo celebra seu gol; a falta jamais vista; seria uma briga? Sim, mas com a bola; a defesa de Calin Albut que antecede o terceiro gol; Ah, se fosse a Bulgária na Copa de 1994! Fotos: Alessandro Bracht


Jogo: Gaz Metan Medias 3x1 Gloria Bistrita
Data: 23 de maio de 2009
Competição: Rumania Liga 1 Frutti Fresh
Local: Municipal Gaz Metan Medias
Público: quase ninguém mais quatro na bela encosta que circunda o estádio

Estou bem distante de admirar algumas chavonices da crônica esportiva profissional, das quais aqui merece referência aquela que faz de um lance específico o retrato de um jogo; algo como, diria o comentarista, “... mas a jogada que simbolizou a partida” e aí descreveria a qualidade superior ou inferior da mesma como se tal definisse o quão bom ou ruim foi o match. Mas, perante um jogo entre equipes que ao final da temporada 2008/2009 não aspiram absolutamente nada – Gaz Metan Medias é o décimo quinto enquanto o Gloria Bistrita está duas posições acima entre 18 clubes – é de se considerar o relato de um lance específico: por volta dos trinta minutos do primeiro tempo, com o jogo em 2x0 para o scratch da casa, Sandu Negrean fez uma falta merecedora de cartão amarelo no jogador português João Silva. Não seria nada atípico, mesmo em um jogo de faltas inconstantes. O dado aterrador é que Negrean e Silva jogam no Bistrita. Como tal sucedeu? Pelo meu testemunho semi-ocular, a bola chegava tranquilamente ao lusoatleta depois de passe errado de um qualquer do Medias mas antes de tocar no esférico (aproveitando da presença portuguesa) ele foi atingido pela carrinhada fogo amigo. A jogada só não fica de todo incomum em função do nome de um dos envolvidos, o qual não preciso repetir.
Mais sobre o jogo? Tirando proveito do nome que leva este blog, o jogo teve algo realmente de terra de ninguém. Não pelo interesse quase inexistente na partida, revelado pelo público diminuto e silencioso ou porque a Romênia ainda sofre com a pobreza pós-socialista também no futebol, mas em função da total invisibilidade do Bistrita no primeiro tempo. Parecia que não havia ninguém para enfrentar o Medias, o que resultou em fácil vitória, revelada através de dois gols em menos de 15 minutos, ambos de cabeça perante o que deveriam ser zagueiros estáticos. O goleiro Calin Albut até apareceu, movendo-se solitário, como se estivesse naqueles treinamentos cruéis de conclusão, atirando-se epicamente em ambos os tentos. No primeiro, marcado pelo centroavante gigante com cara de bebê chorão Cristian Bud a partir de um cruzamento na segunda trave, ele caiu dentro da própria meta, enredando-se. Quando sete minutos depois o brasileiro Edson Grillo repetiu o feito após assistência vinda da esquerda, Albut não reduziu o grau de esforço. A partir daí – minuto 12 – até o final da metade inicial, muitos passes errados, lançamentos nas mãos do goleiro do Medias – o repositor Cosmin Vatca – e aquela falta.
Mais dispostos, talvez lembrados pelo treinador Cristian Pustai que se a vontade não reaparecesse talvez nem os torcedores da encosta voltariam para a última rodada, os jogadores do Medias resolver dar um gás a mais (infame essa, mas vou manter!) na segunda etapa e entre cruzamentos de destino incerto e duas chances de gol para valer, chegaram ao terceiro. Após avanço rápido pela meia-direita de Grillo, o passe chega Ovidiu Hoban já dentro da área. Ele chuta forte, Albut faz a defesa para lá de complicada, mas a bola chega ao babyavante Bud, que chuta feliz para o gol. Do placar de 3x0 aos 28 minutos para a acomodação foi apenas o tempo de gritar “óbvio!”. Dessa modorra aproveitou-se o Bistrita que com leves golpes, sem muito ruído, fez seu gol. Também foi de cabeça, também perante uma defesa-fantasma e também com algum esforço do guarda-redes. O gol foi de Marius Ciuca, zagueiro (conhecem o Marius?), perto dos 44 minutos. Nos descontos os visitantes quase chegariam ao segundo, o que deixaria a impressão de um jogo carregado de emoções. Não foi.
Mas vale a complacência com estes abnegados – sejam jogadores ou torcedores, pois depois da esperançosa geração livre de Nicolau Ceausescu liderada por Gheorghe Hagi, de destacada figura na inesquecivelmente ruim Copa do Mundo de 1994, além dos médios para bons Adrian Mutu e Cristian Chivu, pouca coisa aconteceu. A última notícia de relevo foi a participação do CFR Cluj na Liga dos Campeões 2008/2009, graças ao título da Liga 1 conquistado debaixo de polêmica. As razões: originalmente o Cluj é húngaro, pois foi fundado em 1907, quando a Transilvânia ainda não havia sido anexada à Romênia. Assim, sua base torcedora é de ascendência magiar, o que reascende a tensão étnica, fortemente reforçada pelo prefeito ultranacionalista a serviço da causa romena. O dinheiro que permitiu ao Cluj deixar os tradicionais Dínamo e Esteua de Bucareste para trás vem de um suspeito proprietário chamado Árpád Pászkany, também etnicamente magiar, que recheou o time de portugueses. Estes, claro, fizeram a diferença. A partir daí, porém, o problema fica por conta da permanência das injeções fartas de capital. Pois se, porventura, Pászkány resolver investir em outra paragem ou desperdiçar o dinheiro até quebrar, como muito acontece, o CFR Cluj terá dificuldades em rever a luz do sol. Os torcedores, depois da euforia, irão saber se a glória compensa a posterior queda livre. Nesse momento, faltando duas rodadas para o final do campeonato, o Cluj está apenas em quarto lugar e sem chances de chegar novamente ao primeiro posto.