quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

West Ham United F.C x Millwall F.C.

Da esquerda para a direita: os assentos inferiores vazios do The Sir Trevor Brooking Stand; Kevin Nolan entra por cima para receber o cartão vermelho; Carlton Cole faz o Upton Park "tremer"; Robert Green se estica, mas não consegue evitar o empate do Millwall; o choque faltoso de Faubert contra Forde origina o gol da vitória do West Ham; a bola encontra a rede da goleira vazia e o match está decidido. Fotos: Alessandro Bracht


Jogo: West Ham United F.C. 2x1 Millwall F.C.
Data: 04 de fevereiro de 2012
Competição: NPower Football League Championship
Local: The Boylen Ground (Upton Park)
Público: 27.774 expectadores (e muitos fantasmas)


Foi quase insuportável, mas eu resisti. Pelo futebol aturo muita coisa, é a minha zona de tolerância em nome de algo que é bem mais forte que duas horas e tanto de comentários monocórdicos a respeito do East London Derby. Isto porque antes, durante e depois do jogo bem pouco além de histórias de violência entre as torcidas de West Ham e Millwall emergiram das gargantas de locutores, comentaristas e repórteres envolvidos na transmissão da partida. Todas as histórias narradas, obviamente, eram pontuadas por vozes da indignação, por gritos contrários ao absurdo da violência relacionada ao futebol. Não houve, entretanto, seja lá em qual rede de televisão que fosse, a coragem de admitir que o clássico do leste de Londres não estava sendo transmitido por causa do futebol, mas apenas porque havia a vã esperança de que a porrada comesse em frente às câmeras. Para a tristeza da mídia, nada aconteceu. A partir disso, porém, há uma pergunta a ser respondida: por que o hooliganism, um fenômeno que teve seu heyday no princípio dos anos 1980, faz menção de voltar? A patética resposta se concentra na recente produção cinematográfica em torno do tema. Porcarias como "Violência Máxima" (que titulozinho para The Football Firm, 2004) e "Hooligans" (Green Street Hooligans, 2005) fizeram das brigas entre torcidas um elemento do tempo presente, algo que acontece em pleno século 21. Muitos acreditaram na lorota. Outros acharam a lorota linda e resolveram colocá-la em prática. Porque é mais do que justo afirmar que o Millwall, um clube que desde sua fundação (1885) esteve apenas duas vezes na primeira divisão e nos demais temporadas circulou basicamente entre as segunda e terceira divisões (também esteve na quarta por algo como cinco temporadas), não seria conhecido fora do Reino Unido caso tais filmes não existissem. E o match entre as duas equipes muito menos. Até porque ele acontece com a mesma raridade que um Come-Fogo (também não conhece? Pois bem, trata-se do clássico entre Comercial e Botafogo, ambos da cidade de Ribeirão Preto e sobre o qual nunca foi feito um filme).
Em 2009, quando após um largo período West Ham e Millwall se encontraram pela Carling Cup – também conhecida como League Cup -, houve uma tropa de imbecis que invadiu o campo para aparecer na televisão. Para eles, o resultado foi o banimento pela vida dos estádios de futebol, pelo menos nas fronteiras do Reino Unido. Porque o hooliganismo real, depois da reforma empreendida a partir do famoso Relatório Taylor (1989), passou a acontecer e de forma bem reduzida nas ruas – fato registrado também no derby de 2009 – e por razões bem diferentes daquelas atreladas à crise do trabalhismo dos anos 1970: futebol, brigas e bebedeiras eram válvulas de escapa da classe trabalhadora britânica e não um Big Brother com gosto de sangue. Os estádios viraram portos seguros. Com o rebaixamento dos Hammers da Premiership e o acesso dos Lions da League One na última temporada, dois encontros tornaram-se obrigatórios. No primeiro, em setembro de 2011, a histeria chegou ao extremo. Além do justificado aparato policial, a transmissão da partida não foi autorizada e nenhum repórter estrangeiro pode ingressar no estádio. Algumas câmeras foram instaladas, mas apenas para registrar as highlights da partida, que acabou em 0x0. Como não houve nenhum incidente que manchasse a límpido e cristalino futebol inglês, o segundo encontro ganhou a tela. Desta feita, ao invés de esconder, a ideia foi mostrar ao mundo como a Inglaterra lida habilmente com a situação. O mais visível ato foi isolar a torcida visitante na parte superior do The Sir Trevor Brooking Stand e manter vazios todos seus assentos inferiores. No mais, centenas de policiais espalhados pelo entorno do estádio, pubs fechados e mercados (aqueles que quisessem abrir) proibidos de vender bebidas alcoólicas. Resultado: pobres redes midiáticas, ficaram sem uma gota de sangue para lamberem aos gritos de “vergonha”, “brutalidade” ou, como estampou o Express no embate da Copa, “The Night of Shame” e “The Dark Ages”...
Restou o jogo. Esse, ao contrário do comportamento dos torcedores, teve bem cara de anos 70/80. A velha fórmula dos lançamentos longos e cruzamentos pelo alto a partir do bico da área foi o máximo de nostalgia oferecida aos olhos do expectador. Tanto que foi por aí que o jogo se resolveu. Nos descontos do primeiro tempo, falta alçada e Winston Reid raspou de cabeça para trás na entrada da pequena área. Carlton Cole, metido entre os defensores do Millwall, cabeceou para o gol. Com um homem a menos desde os nove minutos graças a questionável expulsão do capitão Kevin Nolan, os Hammers venciam. O empate dos Lions surgiu de um descuido da zaga que via a bola saindo pela linha de fundo e não reparou no esforço de um jogador adversário que a rolou para o meio da grande área. Liam Trotter pegou de primeira e marcou um lindo gol aos 66’. Entretanto, três minutos depois, bola alçada da intermediária. O goleiro David Forde saiu da meta para socá-la e foi atingido no ar por Julien Faubert, que se projetou contra o goleiro do Millwall. A falta não foi marcada e a bola sobrou para Reid chutar de fora da área para o gol vazio. Jeito cruel de perder um derby e de ver a zona de rebaixamento para a League One cada vez mais próxima. Por conta disso e do provável retorno do West Ham a Premiership já na metade de 2012, as sensacionais histórias de violência contadas ao longo da partida ficarão em suspenso por muitos anos. Eu, de minha parte, agradeço.

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